EXPOSIÇÃO
A arte da transformação
Artista goiano Siron Franco expõe novamente no Recife após 30 anos e conversa com o Viver sobre sua ligação com o Nordeste
Por: André Guerra
Publicado em: 26/03/2024 06:00
Uma produção artística que começou na infância, em Goiânia, e seguiu se desdobrando em diferentes e desafiadores formatos, a obra do premiado Siron Franco acaba de retornar ao solo pernambucano após quase 30 anos da sua última exposição na capital. Já disponível na Galeria Marco Zero, no bairro de Boa Viagem, a mostra intitulada ‘Siron Franco: De dentro do Cerrado’, que reúne cerca de 50 obras do artista, entre pinturas e esculturas, conta com a curadoria do professor doutor Agnaldo Farias, da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo. Com visitação de segunda a sexta, de 10 às 19 horas, e no sábado, de 10 às 17 horas, a entrada é gratuita e fica aberta ao público até o dia 3 de maio.
Pinturas a óleo e ainda algumas das célebres esculturas de Siron compõem uma seleção de trabalhos que vão desde o começo dos anos 1990 até obras feitas em 2023. A produção é realizada quase inteiramente em Goiânia, onde ele reside e busca sua inspiração a partir da vivência no cerrado brasileiro e na paisagem ao mesmo tempo cheia de belezas e contradições. Política por natureza, sua obra denuncia a exploração de recursos naturais e frequentemente se aproxima da causa indígena, tanto na retratação objetiva da problemática quanto nas mudanças de perspectiva estética.
Em entrevista ao Viver, o artista, hoje com 76 anos, mencionou a variedade formal de seu trabalho e as alterações que o mesmo sofreu com o passar das décadas. “Durante algum tempo minha obra passou por uma certa crise de identidade, porque, a cada exposição, para algumas pessoas parecia que eram trabalhos de artistas diferentes. Mas eu valorizo justamente essas mudanças, que nos transformam e modificam nossas obras, dão novas dimensões a elas. Acho isso muito bonito”, explica Siron, que fala ainda sobre a oportunidade de ter essas peças selecionadas e dispostas a partir do olhar do curador Agnaldo Farias. “É sempre muito interessante ver nosso trabalho numa exposição em uma curadoria com um olhar tão criterioso como é o caso de Agnaldo, um profissional excelente, porque é uma visão de fora da nossa obra colocada de uma maneira que sempre nos surpreende”, conta.
Perguntado sobre a relação de seu trabalho com Pernambuco, Siron destacou as conexão que criou com o estado e com a capital desde a primeira vez que expôs em Recife, ainda na década de 1980 – período em que passou também a trabalhar como escultor. “Desde que expus aqui pela primeira vez, criei uma ligação muito grande com os artistas e me tornei amigo de pessoas incríveis. Fiquei muto feliz de poder expor aqui novamente e a Marco Zero faz sempre um trabalho lindo. Estou, inclusive, me organizando para passar de fato alguns meses em Pernambuco, sobretudo nas paisagens de Olinda, e assim poder me dedicar a produzir retratos dos meus amigos da região. Minha alma é nordestina”, completa.
Na exposição está disponível o documentário Siron: O tempo sobre tela, de Rodrigo Campos e André Guerreiro Lopes, que reuniu ao longo de anos imagens produzidas pelo próprio artista e doadas aos diretores, além de depoimentos seus sobre sua obra.
O curador Agnaldo Farias enaltece a importância de Siron na arte brasileira em sua versatilidade e relevância social. “Siron nunca tratou o político como uma questão menor. Ele sempre teve uma visão de Brasil que ultrapassava o país urbano e, nesse sentido, fez vários trabalhos que traziam questões urgentes, de cunho social, como a causa indígena. Ele se interessa pelo que acontece ao seu redor, se incomoda. A natureza é muito presente na sua obra, de uma maneira muito particular. Desde que surge no cenário artístico, ele consegue se impor pintando o grotesco, se arriscando em diferentes mídias, no seu próprio tempo. Trabalhou com o figurativo, o abstrato, com a escultura, o vídeo, sempre no seu tempo, sem seguir tendências”, afirma Agnaldo.
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